Adeus, Beatriz!
- Obrigada ti Beatriz. Já lá vamos ver isso tudo a seguir ao almoço está bem?
- Tá. Mas não se esqueça, que lhe podem fazer falta. Aquelas coisinhas dão sempre jeito. Desta vez não tem lá pegas, porque eu agora já não vejo e custa-me a tricotar. Mas, mesmo assim, ainda fiz umas baínhas a uns paninhos de flanela de uns lençóis que andavam por aí. Já achavam que não valiam nada, mas você vai ver os paninhos tão jeitosos que ainda arranjei deles. Esta gente é toda rica hoje em dia, não aproveitam nada, mas eu sei que você aprecia. Fi-los para si.
Na minha dispensa tenho alguns sacos de plástico com restos de trapos velhos. Restos de blusas de tecido acetinado usadas noutros tempos; pedaços de lã que outrora pertenceram a camisolas de abafo; pegas de várias cores, mas todas quadradas, tricotadas enquanto se ouvia a novela, e forradas de fazenda grossa castanha, para usar quando tiro os tachos de fogão; restos de cobertores ja desfeitos, que deram mantas quentinhas para pôr pelas pernas no inverno; chitas floridas crocheteadas em volta, que dão lindos naperons para pôr em cima dos copos na mesa da cozinha ... Tantas coisas mais. Fê-las a Ti Beatriz, pensando em mim.
Para mim.
Guardo-os, alguns, porque sinto que são pedaços de amor, de ternura. Palavras não eram o seu forte. Beijos, abraços, não os conhecia. A vida endureceu-a por ter sido dura consigo. Mas, sei que gostou de mim, que me apreciou de alguma maneira. À sua maneira, foi-me sempre dizendo que sentia que comigo se falava outra língua, outra linguagem - a dos afectos.
- Venham cá mais vezes. Nem que seja só de passagem. Gosto tanto de vos ver.
Sei que ontem balbuciaste o meu nome. "Onde está a Céu?" "Não pode vir avó, mas manda-lhe um beijinho".
Estou aqui Ti Beatriz. Mandei-lhe fazer uma coroa de flores. Logo à noitinha estará pronta. Vão colocá-la aos seus pés. Sei que me levará consigo no coração. Eu, por mim, guardarei até um dia, os seus trapinhos. Adeus Ti Beatriz.